terça-feira, 16 de março de 2010

Poema recitado por Denize Bee na noite cultural do curso de letras português polo de Videira

CONTESTADO

Homens! Vós sois a força que ergue esta ferrovia!

Homens! Vós sois o estorvo que assombra as oligarquias!

É preciso calar a voz, dar-lhe o esporo merecido.

Homens! Ponham-se nos seus lugares, bem distante daqui!

Infelizes! Quem pensais que sois?

No rastro da ferrovia que rasgou o sertão

Ferro, pedra, chão, suor, labuta

Vestígios da dor e da desgraça de uma guerra

Que perdura até hoje na memória de nossa gente...

Lá vem o dragão que cospe fogo e amedronta

Impõe respeito, medo e admiração...

Traz nos vagões o progresso e na fumaça o mau agouro,

No apito estridente da locomotiva, o eco do grito de horror

Num coro de vozes de homens, mulheres crianças e velhos

Humildes, oprimidos, sonhadores, guerreiros....

Protagonistas desta saga, ignorados pelo poder

Abandonados, pobres, desempregados, expulsos de sua terra.....

Esse povo se conflagrou contra a exploração e a aniquilação de seus direitos.

Na luta pelo sagrado chão e da dignidade da vida

Numa mistura de messianismo e revolta

Juntou-se jagunço e agregado, homens que não temiam a morte

Desacreditados, reuniram suas forças, suas armas, e seus sonhos

Fundaram redutos, fortalezas sertanejas, criaram suas normas.

Guerra tirana - caboclos contra a republica

No improviso de suas armas a bravura do caboclo desprovida de medo

Lutando contra um exercito de homens armados até os dentes.

Deu-se a peleja do contestado, o conflito estava armado

Mártires, heróis e anônimos derramaram seu sangue, fecundaram este chão.

Sangrento episódio com dimensões incalculáveis

Espetáculo macabro, capitulo abominável da história.

Drama social, vertente de dor e repulsa contra a tirania.

Mácula que o tempo não apaga.

Vislumbra-se o horror estampado nos olhos dos derrotados

Homens cruelmente espoliados de suas querências

Moralmente humilhados, tombam igualmente às araucárias

Atirados às valas comuns, sem os louros de seus feitos.

Emudecem suas vozes, calam seus gritos

Impera o silencio no sertão

Paira no ar o cheiro da pólvora

E das cinzas da destruição.

A história conta os mortos na vasta dilapidação

E abafa os gritos de horror e clemência dos sertanejos

Na ânsia de reclamar o que a eles era de direito.

Que justiça é essa que cheira a sangue?

Triste sina de um povo que acreditou em seus sonhos

Que lutou por justiça e cidadania

Que lutou por um pedaço de terra para viver.

De onde brotava tanta força nessa luta desigual?

Dos monges e profetas que pregavam no meio deles?

Dos lideres que sustentavam um ideal?

Na verdade eram homens desprovidos de sorte

Mas que tinham dentro de si, a esperança.

Que os fez lutar até a morte sem recuar....

Contestado ecoa como um hino fúnebre

No cortejo da barbárie republicana e latifundiária,

Ecoa na voz de todos os desvalidos que morreram na batalha

Ecoa também na voz dos que hoje relembram os fatos.

Este chão que agora pisamos, foi o mesmo chão

Que abrigou homens corajosos e analfabetos

Capazes de escrever com o próprio sangue

A saga da luta pela terra contestada.

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